GIRO DA NOTÍCIA

COMO O MAIOR GRAFITE URBANO VIROU CASO DE JUSTIÇA EM SÃO PAULO?

#Aquário Urbano, projeto idealizado pelo produtor e ativista Kleber Pagú e pelo artista visual Felipe Yung, vem levando cor nos últimos meses a 15 laterais de prédios localizadas nos cruzamentos das ruas Major. O grafite está parado por irregularidades.






Um conjunto de grafites reunindo animais aquáticos no fundo do mar deveria apenas colorir o centro de São Paulo, mas tornou-se um grande imbróglio a quatro meses da data prevista para ser finalizado. O Aquário Urbano, projeto idealizado pelo produtor e ativista Kleber Pagú e pelo artista visual Felipe Yung, vem levando cor nos últimos meses a 15 laterais de prédios localizadas nos cruzamentos das ruas Major Sertório e Bento Freitas, na região da República, centro da capital paulista, porém corre o risco de não ser finalizado conforme o projeto inicial.

Isso porque, segundo os organizadores, o proprietário do Edifício Renata Sampaio Ferreira, que abriga escritórios comerciais e é tombado desde 2012, não autorizou o grafite em um dos murais. Apesar da negativa, os artistas interviram no local e pintaram cerca de 80% da lateral.

"Eu sabia que não tinha autorização do proprietário, mas, no caso desse prédio, decidimos fazer uma ocupação artística. Mesmo sem autorização, entendemos que fazia sentido pintar aquela parede porque ela estava em estado de abandono. Sabíamos que eles poderiam chamar a polícia e que poderia se desdobrar em um processo judicial. Mas, esperávamos que ele (o proprietário) recuasse quando percebesse que estávamos restaurando a parede", argumentou Pagú.

No entanto, não foi o que aconteceu, e a polêmica só aumentou nas últimas semanas. Na quinta-feira passada, dia 21, o produtor artístico foi à delegacia assinar um termo circunstanciado em nome do projeto após três idas da Polícia Militar ao local para tentar impedir que o grafite fosse finalizado.


"Passamos semanas cuidando da parede, porque antes de pintar precisa de restauração para ela não descascar, e não teve nem uma reclamação. No primeiro dia que colocamos cor, eles chamaram a polícia. No segundo também. No terceiro dia de polícia, fomos voluntariamente à delegacia porque entendemos que precisávamos explicar às autoridades o que estava acontecendo", contou.

Da polícia na semana passada, o Aquário Urbano também se transformou em um processo judicial. Pagú recebeu ontem uma notificação da Justiça exigindo que o grafite seja interrompido, sob pena de ter de pagar multa de R$ 50 mil por dia, caso o restante da parede do Edifício Renata Sampaio Ferreira seja grafitado. Além disso, a partir do décimo dia da notificação, a parede deve voltar à cor original, um cinza, diz a notificação.

"O que estou fazendo não altera as características arquitetônicas do prédio. Estou pegando a lateral morta e instalando uma obra de arte. Valoriza o local e traz a população para o centro, que está em estado de abandono", afirmou.

Para dar início ao processo de pintura, segundo Pagú, a equipe de produção do Aquário diz ter recebido, em maio de 2017, uma carta de "apoio institucional" da Secretaria de Cultura de São Paulo, período em que estava sob a gestão do secretário André Sturm. O documento, enviado à reportagem, diz que o projeto "atende a todas as diretrizes da CPPU (Comissão de Proteção à Paisagem Urbana) e está em conformidade com a Lei da Cidade Limpa". No entanto, a atual gestão da Secretaria Municipal de Cultura afirma que não foi pedida uma autorização prévia ao Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental da Cidade de São Paulo (Conpresp) ou ao Departamento de Patrimônio Histórico (DPH) antes da intervenção no edifício tombado. Por isso, informou a pasta, "será aberto um processo para averiguar a situação da intervenção artística no local".

Responsável pela execução do grafite, Pagú começou a observar a arquitetura das cidades quando vendia vassouras e rodos no centro de São Paulo, produzidos de forma caseira pelo pai. Ainda criança, se hipnotizava pela arquitetura das cidades, porém foi só depois de adulto, ao começar um trabalho no Sesc em Belo Horizonte, que iniciou seu contato com a arte. Começou a trabalhar como produtor artístico em 2015 e já desenvolveu trabalhos ao lado de Eduardo Kobra e Hanna Lucatelli.

Apesar da polêmica envolvendo o Aquário Urbano, Pagú diz que não vai deixar de cumprir uma possível decisão final da Justiça, caso seja obrigado a apagar o grafite.

"Não serei eu que vou apagar, prefiro não estar lá, porque eu não apago arte. Não tenho condições de ir lá e apagar essa arte", disse.

No entanto, para tentar reverter a polêmica, promete entrar com recursos para adiar o prazo de dez dias que busca travar os grafites já iniciados.

"Vamos reunir um abaixo assinado com 5 mil assinaturas nos dez dias em apoio à arte urbana. E também vamos ao Conpresp para pedir mais prazo para ter opinião da cidade e argumento para conversar com o proprietário do prédio. Por ser um prédio tombado, a gente precisa ouvir a cidade. Ele não tem o direito de falar sozinho sobre isso", afirmou.

Quinze fachadas cegas com mais de 10 mil metros quadrados prometem compor o Aquário Urbano, que pretende bater o recorde de maior mural do mundo no Guinness. Além dos grafites, a proposta pode ser vista com uso de óculos de realidade virtual. No caso, animais aquáticos como baleias, polvos, águas-vivas e arraias poderão ser vistos em movimento em prédios que compõe o centro de São Paulo. O projeto não tem um patrocinador e conta com doação de empresas interessadas em fomentar a arte de rua. Entre as 15 fachadas, duas são tombadas pelo patrimônio e 13 são particulares. Todas precisam de autorização para serem grafitadas, seja dos proprietários ou do DPH. Segundo os responsáveis pelo Aquário Urbano, não houve contato direto com o proprietário do prédio, que se recusou a falar e negou a permissão para que o prédio fosse grafitado por meio da administradora Dias Fernandes.

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